segunda-feira, maio 23
O ultimo adeus a cidade
Ele apareceu nos meus últimos momentos de vida naquela cidade. Quando tudo se acabava, eis que surge alguma coisa que nasce, aos poucos no meio do turbilhão de sentimentos com que se saí dalí.
Não percebi como aconteceu. Ele também não, certamente. Parece uma daquelas coisas que nos contam e que não acreditamos. Um romance saído de um livro de ficção que nos faz ponderar sobre a existência do amor, e ao mesmo tempo pensar que situações como aquelas não acontecem a muita gente e muito menos acontecerão a nós.
Mas aconteceu. A mim. A ti.
Encontrámo-nos quando nos procurávamos um ao outro, no meio de outras tantas mil almas, perdidas na noite e no alcóol, e deambulámos por ali à beira rio, à procura de assunto para quebrar o nosso silêncio no meio do barulho dos outros. Assim se passou uma noite. Quando me virei para trás e te vi lá ao fundo, já sem distinguir os contornos do teu corpo, senti-me triste sem porquê. Não sei se tinha vontade de repetir tudo outra vez, de te dar o pouco tempo que ainda me restava ali. Talvez por medo queria acreditar que não. Tudo ali era passado. Tudo me lembrava o passado. O passado caminhava por ali, lado a lado comigo e contigo, a olhar-nos sem nos ver.
Mas os dias seguiram-se, um após o outro, e tu ficaste comigo. De uma maneira ou de outra, a quilómetros de distância permanecias como uma recordação até chegares para ficar um ou dois dias, não mais. Era o tempo que tínhamos. Um tempo que era escasso e que nos fez viver as horas como elas eram: as únicas, as últimas.
Lembras-te de como era quando chegavas? Lembras-te de como era quando olhavas para mim e eu para ti e tudo à volta desaparecia? Que saudades daqueles dias....
Não o sabíamos ainda, mas tinhamos muito pela frente. As certezas eram poucas. Qualquer sopro de vento, gota de chuva, floco de neve ou raio de sol podiam ter feito desaparecer os laços que nos uniam. Não eram nenhuns. Nada senão uma mistura de desejos e quereres. Mas não foi assim. O vento e a chuva só nos fizeram mais fortes. O sol fez-nos crescer. Hoje tenho a certeza que o que conseguimos se deve àqueles primeiros momentos de incerteza. Se tivessemos iniciado a viagem com certezas, teriamos perdido tudo pelo caminho. Teriamo-nos perdido um do outro...um ao outro...
Não tenho dúvidas agora...
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